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Alternativas Terapêuticas e Educacionais para Crianças com Transtorno do Espectro Autista: muito além do ABA

Por Thais Emilia de Campos dos Santos( Psicopedagoga e Psicanalista, Doutora em Psicologia da Educação e mãe de criança autista)

Nos últimos anos, o Transtorno do Espectro Autista (TEA) tem recebido cada vez mais atenção em diversas áreas, principalmente no que diz respeito às intervenções terapêuticas e educacionais. Uma das abordagens mais amplamente divulgadas e utilizadas é a Análise do Comportamento Aplicada (ABA), que visa modificar comportamentos através de reforços positivos e negativos. Embora tenha demonstrado eficácia em muitos casos, é fundamental destacar que o ABA não é a única alternativa disponível para crianças com TEA e nem sempre a mais apropriada.

A literatura recente, incluindo os trabalhos da psicopedagoga e psicanalista Thais Emilia de Campos dos Santos, com mais de 20 anos de atuação na área, doutora em Psicologia da Educação (Unesp) aponta para uma diversidade de intervenções que vão além da abordagem comportamental, respeitando as singularidades de cada criança e promovendo seu desenvolvimento de maneira mais integral e humanizada.

Uma dessas abordagens é a Psicanálise, que oferece um olhar subjetivo sobre a criança autista, priorizando o entendimento de seus desejos, angústias e formas de se relacionar com o mundo. Compreendo os momentos onde a autorregulação é necessária. Em vez de se concentrar exclusivamente na modificação de comportamentos visíveis, a Psicanálise busca compreender os significados subjacentes e estabelecer uma comunicação com a criança a partir de suas expressões singulares. Essa abordagem valoriza o lugar da escuta ativa e do afeto como fundamentais para o desenvolvimento emocional, social e consequentemente cognitivo.

Compreendendo os momentos onde a auto-regulação é necessária, essa abordagem reconhece que, para muitas crianças com TEA, o isolamento e o recolhimento são formas legítimas de lidar com sobrecargas sensoriais e emocionais. Respeitar esses momentos é essencial, pois eles não são necessariamente um sinal de fuga ou desinteresse, mas uma maneira de a criança se autorregular e encontrar equilíbrio.

A autorregulação é um processo pelo qual a criança aprende a reconhecer seus limites e adotar comportamentos que ajudam a reduzir a ansiedade, o estresse ou o desconforto. No caso de crianças autistas, momentos de isolamento podem ser uma forma de proteger-se de estímulos excessivos ou de situações que elas ainda não conseguem processar completamente. Forçar uma interação contínua ou tentar modificar esses momentos de recolhimento pode causar frustração e aumentar a ansiedade, afetando negativamente o desenvolvimento emocional e social.

A Psicanálise, portanto, valoriza a escuta ativa e o afeto, buscando estabelecer uma comunicação que respeite o tempo e o espaço da criança. Isso envolve observar não apenas o que é verbalizado ou expresso diretamente, mas também os sinais mais sutis, como o silêncio ou o distanciamento. Em vez de tentar moldar o comportamento de forma imediata, a abordagem psicanalítica trabalha no sentido de oferecer à criança um ambiente seguro onde ela possa se expressar conforme suas próprias necessidades, promovendo uma relação de confiança.

Essa perspectiva reconhece que o desenvolvimento emocional, social e cognitivo está interligado. Respeitar os momentos de isolamento e a necessidade de autorregularão não é uma forma de “deixar a criança à parte”, mas sim de criar oportunidades para que ela possa processar o mundo ao seu redor em seu próprio ritmo. Isso ajuda a construir uma base sólida de confiança, permitindo que a criança desenvolva habilidades sociais de forma mais autêntica e conectada com suas emoções.

Na perspectiva psicanalítica, é fundamental tentar compreender as subjetividades dos hiperfocos em crianças autistas, pois eles representam mais do que interesses isolados ou comportamentos repetitivos; são expressões profundas da vida psíquica da criança. Um hiperfoco pode funcionar como uma forma de a criança se conectar com o mundo e expressar sentimentos, desejos e até mesmo pedidos de ajuda que, por outras vias, talvez não fossem tão facilmente comunicados.

Ao invés de tratar os hiperfocos como comportamentos a serem eliminados por meio de estímulos externos, como algumas abordagens comportamentais sugerem, a Psicanálise busca compreender o que o tema do hiperfoco significa para a criança. O que ela está tentando expressar por meio desse interesse específico? Quais angústias, medos ou alegrias estão sendo externalizados através dessa intensa concentração em um único objeto ou tema? Esses são pontos essenciais para se criar um vínculo genuíno com a criança, pois ao respeitar e explorar o significado do hiperfoco, o terapeuta pode abrir um canal de comunicação mais autêntico e significativo.

Os hiperfocos, nessa visão, não são algo a ser corrigido ou controlado, mas sim portas de entrada para o mundo interno da criança autista. Eles podem revelar muito sobre seus sentimentos e como ela processa o ambiente ao seu redor. Ao se interessar pelo que a criança está profundamente envolvida, o adulto ou terapeuta valida a sua experiência, ajudando-a a sentir-se compreendida e respeitada. Isso fortalece o vínculo entre a criança e o outro, criando uma relação baseada no afeto e na confiança.

Além disso, tentar eliminar os hiperfocos de forma abrupta, por meio de estímulos externos, pode ter consequências negativas para a saúde mental da criança autista. O hiperfoco muitas vezes funciona como um mecanismo de autorregulação, ajudando a criança a lidar com situações de ansiedade ou sobrecarga sensorial. Interferir nesse processo sem uma compreensão mais profunda pode desestabilizar o equilíbrio emocional que ela encontrou e aumentar sentimentos de frustração ou desamparo.

Portanto, a Psicanálise propõe uma abordagem mais respeitosa e empática. Ao buscar compreender o que o hiper foco significa no contexto subjetivo da criança, podemos não apenas apoiar seu desenvolvimento emocional e social, mas também oferecer-lhe o espaço para expressar sentimentos e pedir ajuda de uma maneira que respeite sua singularidade. Afinal, é através dessa escuta ativa e dessa valorização dos interesses da criança que estabelecemos vínculos mais profundos e colaboramos para a promoção de sua saúde mental e bem-estar.

Em suma, a Psicanálise propõe um caminho que valoriza a singularidade da criança autista e reconhece que momentos de isolamento podem ser fundamentais para o seu bem-estar e desenvolvimento. Assim como, também, há momentos onde a criança precisa ser abraçada pelo seu cuidador para sentir-se segura, autorregular-se e aclamar-se. Por meio da compreensão e respeito ao seu tempo interno, essa abordagem promove o desenvolvimento integral da criança, sem imposições externas que possam suprimir sua verdadeira forma de ser.

É importante ressaltar que não existe uma abordagem única que funcione para todas as crianças com autismo. A escolha de terapias e estratégias educacionais deve ser sempre pautada na singularidade de cada criança, respeitando seu ritmo e suas necessidades específicas. Enquanto o ABA pode ser eficaz para algumas famílias, outras encontram mais benefícios em abordagens que consideram o desenvolvimento emocional, social e a expressão artística da criança.

Como ressalta Thais Emilia, “a inclusão de crianças autistas no processo educacional e terapêutico precisa ir além de técnicas comportamentais e se abrir para uma escuta mais ampla, que acolha a diversidade humana em todas as suas formas“. Dessa forma, os profissionais da educação e da saúde devem estar abertos a um leque mais abrangente de possibilidades, construindo intervenções que promovam o desenvolvimento integral da criança com TEA.

Essa multiplicidade de caminhos terapêuticos e educacionais reforça que o ABA não deve ser visto como a única solução. É necessário explorar e valorizar outras abordagens que, ao lado de práticas baseadas no afeto e na singularidade, promovam uma educação inclusiva e humanizada para crianças com autismo.

A professora Doutora Thais Emilia- atende presencial na cidade de São José do Rio Preto e na cidade de São Paulo. Agendamentos no WhatsApp (11) 946080362

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